A velha inovação

Photo by Dietmar Becker on Unsplash

Inovar não é novidade. Quando Edmund Cartwright criou primeiro tear mecânico (em 1785), ou Johannes Gutenberg concebeu a prensa de tipos móveis (mais ou menos em 1450), eles estavam inovando. Ou melhor, trilhando rotas de inovação que culminaram com seus inventos. O mesmo podemos dizer de Al-Khwarizm, matemático árabe que fez o primeiro tratado sobre álgebra, por volta do ano 800. Se quisermos ser radicais, a própria pedra lascada foi inovadora em algum momento, assim como toda tecnologia desenvolvida pelo ser humano desde os seus primórdios.

Hoje em dia, a inovação está na moda, e não é só no vocabulário corporativo ou nos laboratórios de tecnologia. As instituições tradicionais e as relações humanas também estão passando por mudanças drásticas, em um impulso de renovação que vem se intensificando, principalmente nos últimos 30 anos.

Photo by Jason Olliff on Unsplash

Mas isso não quer dizer que tudo vai mudar de uma hora para a outra. Ao contrário, toda transformação acontece a partir de um processo anterior. Se configura aos poucos, como desdobramento lógico do contexto e suas mutações. Portanto, é impossível que ela aconteça sem antes dar indícios da sua chegada. Da mesma maneira, suas consequências podem ser identificadas, sugerindo os contornos do próximo ciclo de inovação. Entender esse ciclo e estar atento aos seus sinais é fundamental para reagir a ele de forma construtiva.

Nada disso é novidade na história da humanidade. A grande diferença dos tempos atuais para os processos de inovação do passado é a velocidade com que eles ocorrem. Uma evidência disso é o número de anos considerado entre uma geração e outra. Se Heráclito, em torno de 400 a.C. propunha um período de 30 anos, atualmente é bem aceita a teoria que divide gerações de 10 em 10 anos. Isso porque as diferenças comportamentais entre pessoas nascidas neste ou naquele período já são significativas o suficiente para classificá-las como dois grupos diferentes.

O ritmo da realidade nos força a ressignificar a relação com o próprio tempo.

É fácil constatar esse efeito em nossa própria vida. Qualquer pessoa que já tenha atingido a maioridade é capaz de apontar alguma coisa que era impensável a 10 anos atrás e hoje já é trivial. O pen drive é um exemplo claro disso. Chegou ao mercado em 2000, como um dispositivo inovador capaz de armazenar até 8 megabytes (mais do que o dobro do seu antecessor, o disquete), e atualmente é vendido como chaveiro em bancas de jornal, com capacidade de 8 gigabytes ou mais. Ao que tudo indica, depois de quase uma década de aprimoramento expressivo, caminha para um lento desaparecimento desde a popularização dos serviços de armazenamento em nuvem.

Photo by Diz Play on Unsplash

A pressão mercadológica para inovar impulsiona a pesquisa e o desenvolvimento de novas soluções. Isso significa que as oportunidades podem surgir a toda hora, em campos diversos, mas também leva empresas a arremessar no mercado produtos mal acabados; ou ainda disfarçar de inovação um uma alteração mínima na composição do produto. Assim, o consumidor acaba se frustrando e, em pouco tempo, desenvolve uma desconfiança generalizada, e muito justificada, em relação às promessas inovadoras que pipocam por aí. Uma ideia nova, por mais disruptiva que seja, corre o risco de ser recebida por muitos com indiferença, diluída numa infinidade de “coisas inéditas e imperdíveis”.

Este surto de inovação (real ou apenas aparente) leva a essa banalização do ineditismo. Tudo isso é agravado por campanhas de comunicação agressivas, o que muitas vezes acaba gerando uma expectativa desmedida diante de inovações meramente cosméticas, que empurram para o segundo ou terceiro plano propostas mais relevantes.

Museus de grandes novidades.

O ciclo de renovação intensa também traz uma vida útil breve para muitas coisas, desde hábitos até as aparatos. Um grande número de produtos e tecnologias ganham muito destaque no momento de seu lançamento, mas rapidamente caem na obsolescência absoluta (Google Glass, TV 3D e pizza no McDonald’s, para citar só alguns exemplos).

Photo by Alexander Andrews on Unsplash

São produtos cujo conceito não estava necessariamente equivocado, mas que chegaram ao mercado em um momento inapropriado. Seja por antecipação ou atraso, não alcançaram a relevância prometida entre os consumidores, nem o rendimento esperado pelos produtores.

Se inovar já não era novidade no tempo da pedra lascada, hoje em dia está claro que ela é cada vez mais uma necessidade e menos um diferencial. Diante disso, é fundamental desmistificar a inovação e trazer para o campo da prática um conceito que está muito disseminado no discurso das empresas, mas não necessariamente na sua atuação.

O exercício de identificar os traços de um processo de transformação, estudar os fatos do passado e prever suas consequências para o futuro não é simples, mas é fundamental para andar com firmeza e evitar as armadilhas no caminho da inovação.